Agosto 2014: Península de Itapagipe

Península de Itapagipe: terra de aterros


 Nosso itinerário na Península, dia 29/08/2014

Lorena Volpini




Merleau-Ponty escreve que "o presente ainda conserva em suas mãos o passado imediato, sem pô-lo como objeto, e, como este retém da mesma maneira o passado imediato que o precedeu, o tempo escoado é inteiramente retomado e aprendido no presente".
Assim, aquilo que vivemos em constante presença com a cidade poderá ser retomado e novamente apreendido por estas bandas de cá.


Confesso. Meus itinerários são os de um ceticismo dionisíaco, quase sempre. Não obstante, julgo compartilhar da convicção de uma ontologia de coincidências incertas que se revelam.
Esta semana tive duas leituras que certamente estiveram a enriquecer o meu mundo. Primeiro, a reflexão de Heidegger sobre a ponte e, segundo, a biografia "Milton Santos: reflexões póstumas de um livre pensador".
Seguirei com as palavras mesmas do Heidegger. "A ponte pende 'com leveza e força' sobre o rio. A ponte não apenas liga margens previamente existentes. É somente na travessia da ponte que as margens surgem como margens. A ponte as deixa repousar de maneira própria de uma frente à outra. Pela ponte, um lado se separa do outro. As margens também não se estendem ao longo do rio como traçados indiferentes da terra firme. Com as margens, a ponte traz para o rio as dimensões do terreno retraídas em cada margem. A ponte coloca numa vizinhança recíproca a margem e o terreno. A ponte reúne integrando a terra como paisagem em torno do rio".

  




O livro sobre Milton Santos utiliza o próprio Milton Santos como narrador da sua história, numa "biografia póstuma". Seguirei com as palavras mesmas do Milton Santos. "Irmã Dulce chamava a minha atenção porque expunha aos olhos de todos um outro território que a cidade da Rua Chile teimava ignorar. A cidade dos miseráveis da Península de Itapagipe, favelados das marés, o povo dos Alagados, um dos muitos territórios degradados, uma degradação que em meio à indiferença dos abastados, já se estendia a algumas áreas centrais, como as ruas do Pelourinho e os seus velhos casarões e a área comercial da Baixa dos Sapateiros. Enquanto, ao mesmo tempo, subiam arranha-céus no comércio e a Vitória e áreas adjacentes se consolidavam como moradia dos aristocratas afortunados e dos novos ricos. Logo em breve, a atenta observação desses contrastes urbanos da cidade e dos seus personagens novos e tradicionais me proporcionaria vivenciar uma experiência rica, que transportada para o papel, abriria não uma porta, mas uma grande avenida que me daria acesso da Bahia para o mundo".



Foi atravessando a ponte, a experiência de flanar pela cidade com Lorena Volpini Ananda Cerqueira Urpi Montoya Uriarte João Pedro Noronha Ritter Lucas Pereira Carwile Mateus Virgens Vieira, que surgiram as margens.
Ainda surgem, na verdade.














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